Tudo o que podia ter sido e nunca foi
Uma existência tão tenra
podada e caída ao chão
Como um botão de flor
sua grande dor
e grandeza
é tornar-se adubo
para os que virão
Quando a morte me beijou o rosto
Eu finalmente beijei a vida
Tal qual Judas com remorso
pois viveu de forma traída
Estudei pra me gabar
Trabalhei para ganhar
Casei sem nem amar
Pari sem querer cuidar
Vida rica de esnobar
vantagens esmolar
e vem a morte imolar
Isso – absurdo! – me dá paz
Mata o desamor sagaz
Depois de tanto me enganar
Eu vim pra navegar águas revoltas
Não entendo, não descanso
Tanta coisa acontecendo
Um ajuda, outro morre,
ou se muda
E a água me afunda
Sem reação
sufocado
Torno a pegar o bote
Pra de novo ser levado
Água, água em todo lado
Quando alguém me dá mão
Agarro com força
Não deixe a água te levar
Fica mais um pouco
Vem aprender a nadar
Saia do sufoco!
Ai, aí está o teu amor
é grande teu fantasma
ele deslumbra em horror
e sufoca como asma
Você respira fundo
cresce mais que o mundo
Manipula tudo
Pra ninguém te desprezar
Ai, aí está tua dor
sobrevive em torpor
medo de não aguentar
olhando duramente
pro alto e pra frente
não vê o que sente
No lugar indecente
que não te pertence
no passado se perdeu
repetindo o velho clichê
Ai, entendo, é assim…
Esse apego prendeu você
que sem querer disse sim
Me despeço
quebro algo em pedaços
e o que sobra
sem o peso de antes
parece frágil
mas também é leve
Despedida olhando pra trás
é trapaça
Apenas choro e vou adiante
sem me apegar
deixo passar
somente
Cada momento é docemente doído
como a borboleta que sai do casulo
e suas asas ainda não batem
É preciso esperar
Quero escrever recomeçar
mas não sei quando rimar
Como um vulcão no peito
a pressão me oprime
tanta dor e tragédia revive
na minha carne impressa
pela dor, temor e pressa
para sair de tudo e deixar
o que é pesado demais
para suportar
Um passado grudento apegado
Fica pra trás, tu já tá passado!
Fico até meio irritado
E quando, exausto e brabo
resolvo com força esquecer
Daí que o d3/0%!º&* gruda pra valer
Desisto
de me livrar de você
Mas não vou morrer
sem te olhar
sem te dominar
fera dos meus pesadelos
força que suga minha seiva
e ao tocar com a ponta dos dedos
no ódio e no medo
me embarga
uma dor e uma lágrima
Nessa água emocionada
vejo teu grande desejo de ser
melhor do que foi
e deixar descansar o que dói
A morte lenta da tua dor
que meu olhar contempla
com fervor
é inexorável
e desejável.
Deixo tua dor dormir
E levo tua vida ao porvir
Ao pouco que resta
dou as mãos pela fresta
Até deixar tudo sumir
Tudo silencia
Só a minha resistência
ainda me prende aqui
Agora se evidencia
na minha própria experiência
que tudo precisa partir
Não adianta resistir
E agora o que fazer?
Respiro fundo
e olho no mundo
o simples sol nascer.
Na guerra encontro o horror
e na noite o pavor
e raiva e a dor
Não estou só
em cada olhar
de medo ou ódio
o primitivo do humano
insano
E eu sem pensar
nem julgar
Intuo por onde passar
para onde ir
Sem lutar
e sem fugir
Num instante passa a vida inteira
medo delirante, estou na fronteira
sigo em frente proativo
Estouro, grito, fogueira
e o coração ofegante
no peito oprimido
ainda se expande
e sussurra: estou vivo!!