Esse gramado trouxe-me o dia
que deitamos ao sol abraçados
Lado a lado e cansados
Respirando em melodia
Depois da noite, inebriados
– Aproveitando o sol pra secar umas roupas seu Arci!
– É, é. Tô de folga hoje, tem que lavar roupa. Essa vida de maria não tá fácil. A senhora sabe que eu me separei né?
– Pois é, fiquei sabendo, a Tereza foi embora?
– Foi morar num apartamento, depois de 27 anos. Faz três mês já, mas eu ainda não me… eu perdi o chão.
– Ah é difícil seu Arci, é difícil. Eu me lembro quando eu fiquei viúva, tava grávida com mais três filho pra criar (suspiro). Mas Deus ajuda, hoje tão aí tudo criado, mais os neto, tudo com saúde graças a Deus.
– É, ainda isso, eu pensei que ela ia levar o menino.
– Ah não levou?
– Levou nada, tá comigo, só vai no fim de semana. Até… ontem ele falou que queria ir morar com a avó. Mas eu não posso… eu sou o pai, como é que eu vou… não dá. E olha que sou um paizão.
– Eu sei seu Arci, o senhor é um paizão, é verdade. Mas o mais velho já saiu de casa né? E o menino já tá grande, quantos anos?
– Já já, o mais velho casou, o pequeno tá com oito. Mas dá trabalho, vou trabalhar, daí tem que fazer o almoço, dou o almoço pra ele, largo ele na escola, vou correndo pro trabalho, depois pego ele na escola, é corrido, cansa.
– Ah cansa sim! Quando eu fiquei viúva, não tinha ajuda de vó, de ninguém, uma vizinha ficava com eles pra eu poder trabalhar. E eu pagava pra ela, eu ganhava pouco. Daí quando a mais velha tava maiorzinha, uns 9, 10 anos, eu deixava ela cuidando dos menorzinho de tarde. De manhã iam pra escola. Eu ainda fazia faxina nos fim de semana, daí dava pra sobrar uns troco. Roupa pras crianças eu sempre ganhei, sempre tinha uma patroa que ajudava, daí eu aproveitava as mesma roupinha pros quatro.
– É mas não tem descanso né.
– Não seu Arci, tem descanso nunca mais. Por que depois que os filho cresce, vem os neto, e a gente tem que ajudar né? Eu pelo menos ajudo, porque eu não quero que meus filho passe o que eu passei. O meu caçula sabe, ele era meio doentinho, me chamava muito de noite, tive até que levar pro hospital umas vezes. E eu sozinha, não foi fácil. Tinha dias que eu ia trabalhar sem dormir nada nada, nem uma horinha, parecia que eu ia desmaiar. Mas tinha que continuar, tinha que trabalhar.
– Imagino, e todo serviço de casa ainda…
– A minha casa era de menos, fazia o que dava, se tinha roupa e comida pras crianças tava bom. Mas eu sempre cuidei bem do meus filho, nunca deixei faltar nada pra eles. Seu Arci, a gente nunca se arrepende de cuidar bem dos filho. E a vida é assim mesmo, tudo passa seu Arci, tudo passa.
– É, tá certo, é assim mesmo.
– Deixa eu te dizer uma coisa, o meu neto mais velho é um pouco maior que o seu menino, acho que tem umas roupa que tão escapando, não serve mais. O senhor aproveita?
– Aproveito sim, as calça dele já tão ficando curta… ainda isso.
– Graças a Deus, tá crescendo bem. Vou trazer pro senhor. Mas fé em Deus seu Arci que tudo passa, importante é ter saúde.
– É, é, importante é ter saúde.
O amor a nada limita
e a tudo expande
É melodia que cria
um vácuo que brilha
no meu universo gigante
Não importa a linguagem
matemática, musical
auditiva ou visual
Telepático se comunica
e só quem entende
pode amar para sempre
Quando você for ou eu ir
ainda assim, poderemos sorrir.
E se a liberdade te levar
a liberdade vou amar
e nela me expandir.
Por via das dúvidas se chega a Duvidoso. Duvidoso é uma cidadezinha pequena com muitos caminhos. Suas ruazinhas, estreitas e com muitas curvas, levam pra todos os destinos. E sempre é possível escolher um novo rumo, pois as ruelas se entrelaçam, se cruzam e se abraçam, pois temem ficar sozinhas. Os duvidosos vão para todos os lados, perguntando preocupados para onde ir.
Para sair, tem uma única estradinha que leva à cidade vizinha, onde tem um grande pórtico escrito: Bem-vindo a Decidido!! Lá só é possível ir para frente, em grandes avenidas retas e não convergentes. Os decididos são independentes, conversam com pouca gente, ninguém lhes cruza a frente.
Um dia, um inventor que visitava a região, cansado dessa repetição, imaginou a cidade perfeita, e num papel branco desenhou linhas pretas – as avenidas decididas… e pontilhou por cima os volteios duvidosos. Era perfeito! Todos podiam ir para todo lado, com rumos claros à frente, tudo integrado.
Então, como era inteligente, vendeu seu projeto para um grande arquiteto, que construiu a cidade Planejada. Todos preferiram morar lá, a vida ficou criativa e movimentada, e Duvidoso e Decidido viraram museus arquetípicos.