Sem medo ou temor

Não temo mais nada na vida

nem dificuldade atrevida

nem depressão funda caída

simplesmente porque já cresci

 

Não temo mais nada na vida

nem a maior felicidade

nem velhice nem mocidade

existo plena sem reservas

 

Não temo mais nada na vida

Nascer, renascer ou dar a luz

Prender, me algemar, Habeas-corpus

Aceito os limites e engrandeço as liberdades

 

Não temo mais nada na vida

Amor puro ou medo do açoite

O dia nasce após a noite

Estou presente a cada instante

Revigorar

A dor é importante

torpor instigante

que pula em instantes

uma oitava acima

E lá estava a rima

numa geometria 

não vivida antes

Consolida a vida

na lida do tempo

e daqui contemplo

o outrora tormento

já se revigora

Escolhas

Nenhuma escolha é fácil

Mesmo o menor esforço

traz algum remorso 

faz se sentir frágil

 

Ao abraçar a superação

com toda veemência

vem o desejo de conforto

a preguiça opõe resistência

 

A liberdade cativa

a quem se atira

Mas logo termina

como cruzar a piscina

 

Atravessar os mares

aporta imensidão

mas impõe dificuldades

de perder o chão

 

seja qual for a decisão

que ao menos não seja em vão

A violência a atacou

A violência a pegou de assalto, traiçoeira pelas costas, sem chance de defesa, de reação, a tirou do chão. Dor, tristeza, ela só queria cuidar e curar. Não deu tempo para nada, impossível entender o porquê. Impossível evitar. Se ela pudesse prever, não estaria lá. Agora só queria um colo quentinho, queria chorar mansinho. Está se acalmando, é só deixar passar. Alguém ainda gritou: Isso não pode ficar assim! Justiça! Vingança! E ela falou: conheço quem me atacou, era eu há trinta anos atrás.

Condenado

Arrastando o peso

atado aos pés

Não posso fugir

nem parar

tenho que seguir

 

Me sinto preso

Ao revés

queria sorrir

amar, cantar

Mas para onde ir?

 

Uma forca, fim da linha?

Ou um tiro na espinha

vai atravessar?

Vou sentar

e eletrocutar?

 

Se pudesse pagar

de outro modo que não com a vida

 

Ainda assim seria pagar

uma dívida infinita

 

Como se mede o subjetivo?

Quando termina minha dívida??

 

O que está acontecendo?

Todos estão se reunindo

Estou vendo 

e ouvindo

Eles começam a me olhar

 

Decidimos aceitar

que dor não tem pagamento

importa é evitar

propagar mais sofrimento

 

Só caminha a contento

quem para de se voltar

Pós-niilismo

Nas dificuldades 

encontrei verdades

que guiam minha vida

Perdi toda a vaidade

Foi uma dor, sabe

bem dolorida

Ainda lembro

um ou outro dia

daquele tempo

que eu sentia

que tudo podia

Ocorre que, seja sina 

sejam escolhas

daqui hoje posso ver

era só plástico-bolhas

Hoje tenho liberdade

vivo em paz, bem direito

sem apego e sem receio

O caminho do amor é tão liberto

desnorteia a razão certeira

mas o medo se esgueira

até que se aceita

e desiste da luta

Então, abrupta

e abundantemente

veio inovação persistente

e um coração tão grande

que ama toda a gente 

É que sempre vejo e percebo

todas as dores do mundo

Todas, de todos

grandes e pequenos

importantes e bem menos

inteligentes e tolos

pessoa ou animal

todos, afinal

Quem conhece a dor do absurdo

e mergulha no niilismo total

ou sucumbe ao fatal

ou renasce e reescreve tudo

Ressignifica a vida e a morte

e domina o bem e o mal

Na pandemia

Era uma vez um jovem que gostava de fazer muitas coisas 

e tinha que fazer muitas outras de que não gostava

O tempo foi passando, se tornou um adulto

que gostava de fazer algumas coisas mas não tinha tempo

pois precisava fazer outras

Porém, sempre ficava sonhando que realizava

sentindo na sua fantasia a amplitude e realização 

que o dia a dia limitava em vão

Assumiu mais compromissos para, claro

se estruturar e poder então se realizar

Os compromissos tomaram tanto tempo e dinheiro! 

Não dava mais nem tempo de imaginar

Agora não tinha mais amplitude, só obrigações

Esqueceu dos sonhos

a mente aprendeu a só raciocinar

Estava no auge da vida

nunca esteve tão estruturado

e tão limitado 

Então um dia… 

pareceu que deu tudo errado

Doença, surto, crise, pandemia… 

o que você imaginar, isso mesmo

tudo da noite para o dia

A estrutura parecia que caía. 

Desilusão, sofrimento… 

Ele não era mais nada nesse momento

E começou a sobrar tempo

lembrou de velhos sonhos

Recomeçar? Boa ideia. 

Reduziu os pesos

abandonou as vaidades

quanta perda de tempo! 

Reencontrou vivacidade

Os antigos sonhos não se realizaram

mas os adaptou à realidade 

e esta os abraçou

O ser humano é tão versátil 

O mundo comporta tanto enredo

Realizou-se, foi agradável

não sonhou mais em segredo

Traquina

Experimento a cada dia

breve e leve euforia 

quando só tenho alegria 

e todo contentamento

 

Rima leve e escorreita 

escrita sem receita 

no momento que me espreita 

um firmamento sonolento  

 

Longe de ser perfeita 

falo tudo que eu quero

ah que amanhecer belo 

 

Ideia é um presente

que tanto inspira a gente 

nessa vida cogente 

 

não encaixo na máquina 

que me aperta e tritura 

pois me quebra a postura

então virei traquina

 

Imprudente? 

Certamente!

Mas não indiferente

à magia de renascer

e viver alegremente